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Tóquio 2020

Ana Marcela diz que ouro na maratona aquática serve para coroar toda carreira

Torna-se, ainda, a primeira mulher do Brasil a subir no lugar mais alto do pódio em Jogos Olímpicos após fazer o que chamou de prova perfeita para colocar quase um segundo à frente da holandesa campeã da Rio-2016

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Filha de poseidon (Jonne Roriz/COB)

Tóquio – Treze anos depois da primeira experiência olímpica, chegou o sonhado dia de Ana Marcela Cunha colocar no peito a medalha de ouro dos Jogos Olímpicos. A brasileira foi campeã na maratona aquática em Tóquio na manhã desta quarta-feira (4), noite de terça-feira no Brasil. Fez uma prova perfeita nas águas da Odabaia Marine Park, conseguiu abrir um corpo de vantagem para bater na frente e passar para a história como a primeira mulher campeã olímpica da natação brasileira. Aos 29 anos e alguns minutos após a consagração no pódio afirmou que a conquista “serve para coroar toda a carreira”. Ao mesmo tempo, já queria mais e falava no próximo objetivo, ser campeã Mundial dos 10 km, agora único título que falta para a dona de 12 outras medalhas em mundiais.

“Eu era uma menina que sempre acreditou nos sonhos, nos meus sonhos e nos da minha família, por tudo o que as pessoas fizeram por mim e continuam fazendo. Sou muito realizada, principalmente por ter pessoas sempre positivas ao meu lado. Isso me fez continuar, mesmo quando eu não ganhei medalha em 2008 (Olimpíada de Pequim), não me classificando em 2012 (Londres) e sendo uma decepção para muitos brasileiros em 2016 (Rio). Acho que isso (ouro) representa muito do que eu acreditei e naquilo que estava guardado para mim. São treze anos entre uma Olimpíada e outra”, falou Ana Marcela Cunha, atleta do Time Nissan e Time Ajinomoto. “Eu nunca acreditei tanto no meu sonho. Se não me engano, em 2004 ou 2005, ganhei uma camisa que falava que eu estaria na Olimpíada de 2008. Eu acreditei nisso e estava lá. Acreditei tanto nas pessoas falando o quanto eu podia um dia ser campeã olímpica, que continuou sendo o meu sonho”, completa.

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O Olimpo aos seus pés (Jonne Roriz/COB)

O cara e a mulher

A vitória veio em uma prova perfeita. Manteve a frequência de braçadas abaixo das rivais e, assim, guardou lenha para queimar na reta final. Chegou com um corpo à frente das adversárias, quase um segundo, após manter-se sempre no pelotão dianteiro. Fechou com 1h59min30s8, contra 1h59min31s7 da holandesa Sharon van Rouwendaal, a campeã da Rio-2016 na maratona aquática e prata agora na Tóquio-2020. O bronze foi para a australiana Kareena Lee, cravando 1h59min32s5. “Ainda não tenho noção de como realmente foi a minha prova. Quero rever como foi tudo, mas quando a gente sai com a medalha de ouro, pode dizer que a prova foi, senão perfeita, 99% perfeita. Se o Fernando disse que não tem nada pra comentar, posso falar que foi perfeita.” Fernando é Fernando Possenti, treinador da brasileira. O cara! “O cara que está aí do seu lado (ao lado do repórter que fazia uma pergunta) é o cara que mais acreditou em mim e fez eu acreditar em mim. O Fer é o cara que me trouxe até esse lugar.”

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“o cara que me trouxe até esse lugar” (Jonne Roriz/COB)

“Nós ficamos mais de 50 dias treinando na Espanha. Quando saí, sabia que para ganhar de mim ia ser muito difícil, ia ter de estar mais bem treinada do que eu. Hoje consegui colocar tudo na prova”, disse. Sobre a reta final, revelou que tentou se sentir meio europeia, ter sangue frio, afinal estava prestes a ser a primeira mulher campeã olímpica da história da natação brasileira. “Nós somos latinos, somos coração. Fui muito mais pela razão”, detalhou. “Mulher pode ser o que ela quiser, onde ela quiser, a hora que quiser. O tanto que a gente vem recebendo de ajuda, de igualdade, isso representa muito nas medalhas do Brasil. Isso que o comitê olímpico está fazendo, de ajuda, de acreditar independente se é masculino ou feminino. As mulheres estão vindo com aquele gostinho especial.”

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Rouwendaal, Ana Marcela e Lee (Satiro Sodré/SSPress/CBDA)

Barriga sempre roncando

Mesmo ainda experimentando os primeiros momentos da medalha de ouro na maratona aquática, Ana Marcela já começava a traçar os novos objetivos. “Ser campeã aqui é muito importante e ainda não fui campeã mundial dos 10km, que também é muito importante. Saio daqui querendo mais para o ano que vem. “Quando a gente está satisfeita, a gente para. Por isso que eu falo que minha carreira ainda não está 100%. Ainda fica esse gostinho de quero mais. Enquanto eu estiver feliz com o que eu estiver fazendo, nadando treinando com paixão, amor, tá tudo bem.” A fome insaciável, claro, não tirou o sabor do momento. “Só de já ser medalhista já seria bizarro, então vai demorar um tempo ainda para cair essa ficha, o quão grande é e o quanto minha vida vai se transformar agora. É o que eu sempre sonhei e talvez no decorrer dos dias eu vou me tocar um pouquinho do que é isso tudo”.

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Nem o peixinho pode com a brasileira (Jonne Roriz/COB)

Uma das transformações que certamente o ouro na maratona aquática trará é a evidência do trabalho de Ana Marcela e a consequente inspiração para novas gerações. “Meu esporte é carente de uma nova geração, mas é uma nova geração que pode sonhar, que vale a pena sonhar. Abre portas para quem vem e para continuidade. É só sonhar, só acreditar, ter inspiração. Acreditem nos seus sonhos porque é possível”.

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Mas isso ainda é para frente. Agora ainda é hora de agradecer. “Sou muito grata pela vida, pelo que já passei, pelo que eu tive de passar para chegar até aqui hoje. Acho que tudo é aprendizado. Dizer um muito obrigado para todo mundo, para essas pessoas que estavam comigo, elas sabem quem são”. Há, ainda, um pequeno “problema” a resolver. Onde vai ficar a medalha? “Ainda não sei, talvez no meu futuro instituto, mas com toda a certeza no lugar mais especial que tem. A medalha, como material, representa muito, mas a conquista e a glória de ter sido campeã olímpica fica para sempre na história da maratona, do Brasil, do Time Brasil. Vai ficar no lugar mais bonito que seja”.

Jornalista com mais de 20 anos de profissão, mais da metade deles na área de esportes. Está no OTD desde 2019 e, por ele, já cobriu 'in loco' os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, além dos Jogos Pan-Americanos de Lima e Santiago

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