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Mudar a estatística requer mais entendimento e menos zoação

Uma reflexão sobre a goleada do São Paulo no Campeonato Paulista e a realidade do futebol feminino no Brasil

São Paulo e Taboão da Serra - Futebol feminino
São Paulo goleou o Taboão da Serra por 29 a 0 no Paulistão (Renata Lutfi/saopaulofc.net)

Não é engraçado. Não é pra tirar sarro, zuar ou fazer meme. A goleada do São Paulo contra o Taboão da Serra escancara uma realidade, mas não assusta. O que assusta – mas nem tanto – é a quantidade de comentários pejorativos e piadinhas nada engraçadas. Mas a goleada em si, apesar de lamentável, é parte do processo. Se você está lendo isso, te convidamos a refletir. As mulheres já foram proibidas de jogar. E a pandemia agravou problemas estruturais na realidade do futebol feminino, que tinha tudo para crescer ainda mais, depois de um ano tão especial para a modalidade como 2019 foi.

Emily Lima já havia alertado sobre isso em julho ao OTD Delas: “Acredito que os menores clubes vão sofrer e muito. Muito mesmo, principalmente por causa de pessoas despreparadas em cargos no futebol feminino. A gente vê que a CBF passa um dinheiro para os clubes da Série A1 e A2 e os dirigentes não repassam o dinheiro para onde ele de fato foi direcionado. Já é difícil sobreviver, com trabalho mal feito então… Piora ainda mais a situação”.

Mas ainda bem que essa segunda parte da fala se desatualizou. A CBF trouxe Aline Pelegrino e Duda Luizelli para cuidar da modalidade. E aqui vale destacar também o esforço da Federação Paulista de futebol (FPF), com a transmissão dos jogos do Campeonato Paulista, em parceria com o Facebook e com equipes compostas inteiramente por mulheres.

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O futebol feminino está sim crescendo, mas ainda está restrito aos grandes clubes e a outros poucos e pontuais projetos interessantes. A realidade é muito discrepante e é escancarada em jogos como este do Estadual nesta quarta (21). 

São Paulo e Taboão da Serra
São Paulo e Taboão da Serra pela segunda rodada do Paulista (Renata Lutfi/saopaulofc.net)

“Infelizmente, a gente usa a camisa do CATS, mas em pouca coisa o clube nos ajuda. É mais a comissão técnica, pela vontade. As atletas, sem ganhar nada, ninguém tem salário, condução… A gente não tem roupa de treino. Não temos apoio nenhum do clube, só usamos o nome dele para participar do Campeonato Paulista, porque a gente acredita que é uma boa oportunidade para as meninas mais novas”, disse a capitã Nini no intervalo, quando o placar já era de 17 a 0 para o São Paulo contra o Taboão da Serra.

O problema é político, mas é também cultural, estrutural e social. É cultural, porque são dois pesos e duas medidas quando se trata de futebol para homens e mulheres. Assim como no futebol masculino, o nível do estadual não é inferior ao nacional? Pois então, qual a diferença aqui, no Paulista feminino? 

E é social, porque a desigualdade ainda está enraizada na nossa sociedade. Você sabia que 70% das meninas gostam e querem praticar algum tipo de esporte, mas 49% delas acabam desistindo no meio do caminho, número seis vezes maior que o de meninos? Grande parte dessa estatística se deve ao machismo intrínseco e ao pouco incentivo para mulheres no esporte.

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Talento e vontade não faltam no futebol feminino. Falta oportunidade. E respeito sempre. É necessário investir onde é preciso para fazer um país como o Brasil, que tem um tamanho continental, virar uma potência. 

O futebol feminino é um caminho sem volta e sobrevive apesar de todas as adversidades. Então dê uma chance. Chega de depender de um olheiro ou outro, um projeto ou outro, um time ou outro. É massificar o futebol feminino, o esporte feminino. É mudar a estatística e mostrar pras meninas que elas podem. E é tomar o lugar que – deveria – ser nosso por direito.

*Texto por Fernanda Zalcman e Giovana Pinheiro

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