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1ª medalhista e porta-bandeira: a história de Sandra Pires

Pioneira vezes dois: Sandra Pires entrou para a história como a primeira medalhista de ouro, em Atlanta 1996 no vôlei de praia, e primeira porta-bandeira, em Sidney 2000. Leia entrevista!

A histórica medalha de ouro de Sandra Pires em Atlanta 1996 (Divulgação)

Pioneira talvez seja a melhor palavra para definir Sandra Pires. A brasileira foi a primeira mulher a subir ao lugar mais alto do pódio em Atlanta 1996 no vôlei de praia com Jackie Silva. Sem participar da cerimônia de abertura nessa edição, chegou em Sidney 2000 como a primeira mulher porta-bandeira do Brasil e voltou pra casa com uma medalha de bronze.

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Nesse dia 27 de julho, data em que completa 24 anos do ouro de Atlanta 1996, conversamos com Sandra Pires sobre o feito, a carreira, a dupla com Jackie o futuro do vôlei de praia. Leia abaixo!

Primeira lembrança

Jaqueline e Sandra foram as primeiras brasileiras campeãs olímpicas, com o ouro no vôlei de praia em Atlanta 1996 (Crédito: Reprodução/YouTube)
Jaqueline e Sandra foram as primeiras brasileiras campeãs olímpicas, com o ouro no vôlei de praia em Atlanta-1996 (Crédito: Reprodução/YouTube)

“A medalha, se a gente for por momentos, são vários momentos pra gente. Desde a conquista, do trabalho que foi, de todo investimento, das mudanças na minha vida. Até chegar em uma Olimpíada, como favoritas eu e a Jackie e ligar com aquilo tudo. Realmente, eu era bem jovem, tinha acabado de completar 23 anos. Tinha um mês que eu tinha feito 23 anos. Era muito jovem. Primeira Olimpíada do vôlei de praia, primeira medalha de ouro. Naquele momento ali, tudo ainda muito novo. Cada um foi digerindo da sua forma. A Jackie já tinha participado de outras Olimpíadas, sabia que estava chegando o final de carreira, então aquela medalha ali encerrou um ciclo pra ela. E pra mim começou um ciclo. Realmente, não deu pra avaliar nada na hora. Se eu falar que avaliei tudo é mentira. Não tem condição de avaliar tudo isso.”

Quando caiu a ficha?

A ex-atleta do Vôlei de Praia, Sandra Pires, entrou para o Hall da Fama do COB.©Wander Roberto/COB
RIO DE JANEIRO – 18/12/2018 – PREMIO BRASIL OLIMPICO – Teatro Bradesco – A ex-atleta do Vôlei de Praia, Sandra Pires, entrou para o Hall da Fama do COB.©Wander Roberto/COB

“Bem depois. O que foi muito legal, foi que quando a gente retornou para o Brasil, as pessoas levantavam pra aplaudir a gente onde a gente entrasse. Onde a gente passasse. Era uma alegria, principalmente das mulheres. Uma vitória muito feminina. Isso marcou bastante. Quando a gente andava na rua, as mulheres paravam. Quando a gente passou no carro de bombeiros, elas paravam o carro, abriam a porta e começavam a pular, bater palma. E, assim, foi muito marcante aquilo. A gente estava construindo também. Começando a construir a medalha. Eu acho. Hoje sim ela a gente consegue enxergar tudo que a gente passou. Cada uma dentro da sua vida pra entender o que significou essa primeira medalha de ouro.”

Estreia com ouro em Atlanta 1996

“Eu era muito jovem em Atlanta 1996, então foi naturalmente se encaixando na minha vida. Eu continuei fazendo minhas coisas, me dedicando ao esporte, a gente sabe que é assim, você tem que continuar plantando pra colher. Depois que você ganha uma medalha, você quer outra. Você já sentiu toda aquela energia, todo aquele gosto, como vale a pena trabalhar, investir, se dedicar, fazendo o que você ama. Porque eu acho que o diferencial é esse. É você fazer o que você ama, porque as consequências elas vem depois, a gente fez aquilo por amor ao esporte, ao vôlei de praia, que a gente tanto ama. Depois, fomos vendo todo o resultado. A gente vê até hoje, tanto que estamos falando disso nessa entrevista com você hoje, já vi esse jogo várias vezes no reprise”, brinca Sandra Pires.

Cena inesquecível

Atlanta 1996 - Vôlei de praia - Jacqueline Silva - Sandra Pires - Adriana Samuel - Mônica Rodrigues - Primeiras medalhistas femininas do Brasil
Brasil dominou o pódio do vôlei de praia em Atlanta-1996 (Divulgação)

“Foi marcante na cabeça das pessoas. As vezes as pessoas não me reconhecem, daí quando fica sabendo fala: ‘ah, vocês quatro, que ganharam medalha (na final do vôlei de praia, em Atlanta 1996), eu assisti’. Quer dizer, todo mundo lembra daquela cena, das quatro subindo ao pódio, da primeira medalha de ouro do esporte feminino, então aquilo tudo marcou muito as pessoas. Marcou o Brasil, marcou as mulheres, principalmente.”

A Olimpíada das Mulheres

“A Olimpíada das mulheres porque depois veio o basquete, o vôlei de quadra. Daí a mulherada foi ganhando as suas medalhas.”

O esporte feminino hoje

“A gente evoluiu bastante, mas ainda tem um campo bem aberto pras mulheres se dedicarem, mas isso tudo eu acho que vem exatamente da escola, principalmente, em incentivar o esporte. Dando bolsas. Depois, vem a faculdade. O aluno acaba buscando experimentar mais. Ainda mais essa geração do celular, as pessoas pararam um pouco das brincadeiras que tinham antes de rua. Isso acabou um pouco. Então é muito telefone.”

O advento da internet

“Muita internet, na minha época nem tinha internet. Nem em 1996, nem em 2000. Chegou depois. Ganhei minhas duas medalhas e ainda não tinha internet. Por um lado até ajudou a gente, não ficamos pensando muito nisso. Não sabia nem o que estava acontecendo aqui no Brasil. Estava lá, concentrada, só quando ligava pra casa, que não era toda hora pra falar. Então, assim, até hoje, as quatro estando vivas, acho que é muito legal as quatro brasileiras ainda (eu, Jackie Silva, Mônica Rodrigues e Adriana Samuel) e estão na ativa. Todo mundo dentro da sua área.”

A essência do esporte

“Cada uma dentro da sua área, isso é muito legal. A gente poder se reunir, poder ter essa amizade, depois de tantos anos. É o que o esporte faz também. Ele aproxima as pessoas. É bem democrático, quando você vai praticar alguma coisa, ninguém quer saber sobrenome, quer saber se sabe jogar. E daí vamos embora. Isso é muito legal. Um país que respira esporte, com certeza, é um país muito mais feliz. Eu acho, porque até hoje se eu for ali na praia bater minha bolinha, já ganhei meu dia. Jogar, suar, tomar um sol, ganhei meu dia. Já posso ficar tranquila.”

Parceria com Jackie Silva

Jacqueline e Sandra no pódio em Atlanta 1996 (Acervo/COB)
Jacqueline e Sandra no pódio em Atlanta-1996 (Acervo/COB)

“A gente tinha uma diferença grande de idade. Ela já uma jogadora experiente. Teve que descer alguns degraus pra me esperar, pra eu evoluir e ficar do mesmo nível. Não foi fácil. Até porque eu sai da casa dos meus pais, fui morar com ela na Califórnia e nem a conhecia direito. Vinha toda aquela cobrança do jogo, de querer ganhar, de ter que aprender muito rápido. Eu fui morar na Califórnia por isso, pra acelerar meu aprendizado, porque lá, na época, tinha o melhor circuito de vôlei de praia do mundo, com as melhores jogadoras, as americanas as mais fortes. Encarei logo pedreiras de cara. No início, a gente apanhou bastante, mas a gente estava aprendendo. A gente percebeu isso quando a gente voltou no ano seguinte para o Brasil, o quanto a gente tinha evoluído, quanto a gente tinha melhorado, quanto o time estava voando.”

Cobrança

“Muita cobrança. Cobrança dela, cobrança minha, cobrança do técnico. O esporte tem muita cobrança de resultado. A gente conseguiu ali, mas a gente jogava muito bem. O time tinha uma química muito boa.

Ausência na cerimônia de abertura de 1996

“Claro, eu queria muito ter participado. Mas a Jackie Silva acabou me convencendo lá com as teorias dela de liderança. Eu falei: ‘mas você já foi para duas Olimpíadas, né? Moscou e Los Angeles. Você desfilou?’ ‘Desfilei, mas não ganhei medalha nenhuma.’ Esse era o argumento dela: mas não ganhei medalha. ‘Então essa daqui eu não quero desfilar e quero ganhar medalha’. Eu acabei não desfilando porque a gente estava bem distante (do local) e eu ia ter que ir sozinha pra Vila (Olímpica). Depois, voltar também sozinha, porque era bem distante mesmo. Quarenta minutos. E ela falou que era muito cansativo, que não podia perder o foco e aí eu acabei não desfilando”.

Primeira porta-bandeira mulher em 2000

Sandra Pires, vôlei de praia, foi a primeira porta-bandeira do Brasil em Sidney 2000 (Divulgação)
Sandra Pires foi a primeira porta-bandeira do Brasil em Sidney 2000 (Divulgação)

“Mas fiquei com aquela vontade. Só que ir para uma próxima (Sidney 2000), quatro anos depois, você não sabe nem se você vai se classificar, então tem um processo longo. E é óbvio que a gente não imagina as coisas que vem pela frente. Na outra, eu me classifiquei e ainda fui convidada pra ser porta-bandeira. Mas como eu ia adivinhar tudo isso? É que tudo tem a sua hora, realmente, depois eu aprendi com a minha carreira. Eu aprendi muita coisa. Tudo tem a sua hora, não adianta. As vezes não é a hora e a gente quer tudo, a gente quer tudo parqueia hora, e nem sempre acontece. Depois que aconteceu foi demais. Foi sensacional. Foi um grande presente. Uma grande honraria, uma das maiores honrarias da minha carreira, levar a bandeira brasileira.”

Chances pra Tóquio 2020 no feminino

“A gente está bem representado. A Ágatha que já é medalhista de prata, já tem certa experiência, jogou em casa aqui, maior pressão, jogou a final. Ela pode ajudar muito a Duda, que é uma novata de Olimpíada, mas é uma jogadora já bem experiente de circuito mundial, brasileiro. Então ela já está bem preparada eu acho pra essa Olimpíada. A Ana Patrícia com a Rebecca que são duas jovens jogadoras também, eu acho que se elas conseguirem entrar relaxadas pra jogar, sem elas mesmas se cobrarem, ninguém ficar cobrando delas, eu acho que elas podem ir muito bem, porque é uma dupla que está em ascensão.”

As quatro duplas do Brasil de vôlei de praia, que estão confirmadas entre os classificados do Brasil para Tóquio-2020 (Crédito: Montagem sobre fotos FIVB)
As quatro duplas do Brasil de vôlei de praia, que estão confirmadas entre os classificados do Brasil para Tóquio-2020 (Montagem sobre fotos FIVB)

Chances pra Tóquio 2020 no masculino

“E os homens também. Alison que já tem duas medalhas olímpicas, uma de ouro e uma de prata, jogando com o Álvaro, que é um craque de bola, o canhotinho, motivado pela sua primeira Olimpíada jogando com o Alison. Essa dupla que encaixou bem, que é um defensor incrível, com um dos melhores bloqueadores do mundo. O Evandro com o Bruno Schmidt também outra excelente dupla. Evandro também já tem experiência Olímpica, que estreou no Rio e não foi tão bem com o Pedro (Solberg), mas ali já vivenciou todo o clima. Então já passou por isso. E o Bruno Schmidt campeão olímpico, craque, um cara muito dedicado. Também podem representar muito bem. Principalmente, o Evandro, com o saque que ele tem, melhor sacador do vôlei de praia do mundo, se ele tiver uma regularidade na Olimpíada ele pode conseguir ajudar muito o time. Estamos bem representados. O vôlei de praia sempre trouxe medalha.”

O futuro do vôlei de praia

“É óbvio que a gente fica muito preocupada com a renovação. Porque a gente sempre ganhou muito. Tanto no masculino, como no feminino. E não quer perder, né? Não quer perder tudo que já conquistou. Tem que se preocupar sim com a renovação. O esporte no geral andou passando por vários problemas, crise econômica, isso mexeu muito com os patrocinadores. As etapas do brasileiro diminuíram. A televisão também diminuiu a exibição de tudo que passava. A gente vive nesse equilíbrio aí.”

Tornar atrativo

“Porque o atleta pra ir pra praia, ele tem que ser muito guerreiro e gostar muito. O início não é nada fácil. Não é igual a quadra. O vôlei de praia você tem que pagar sua passagem, hospedagem, equipe. Tem que gostar e querer muito. E as vezes os atletas optam por ficar no vôlei de quadra. Porque no vôlei de praia você tem que esperar mais pra ter os resultados. É um pouco complicado. Vivi uma geração, depois veio outra. E a próxima geração que vier já vai encontrar o cenário todo diferente. Não é fácil. Tem que se pensar um pouco mais no vôlei de praia pra ser mais atrativo, porque com essa estrutura é difícil começar.”

Jornalista formada pela Cásper Líbero. Apaixonada por esportes e boas histórias.

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