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Crônicas Olímpicas

Novo ciclo no esporte brasileiro

Lembro-me com carinho de 2011. Foi quando tirei pela primeira vez o meu passaporte. Quando segurei a caderneta azul nas minhas mãos, com todas aquelas folhas em branco prontas para serem carimbadas, senti que estava perto de concretizar o sonho de participar de um grande evento esportivo fora do Brasil. A jornada começou em Brasília, passou por São Paulo, Panamá, Cidade do México e, enfim, Guadalajara, sede dos Jogos Pan-Americanos daquele ano.

Em 2007, já tinha acompanhado de perto os Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro, mas, no México, seria a primeira vez em uma país estrangeiro. Eu carregava uma mistura de euforia e medo do desconhecido. Foram 20 dias comendo comida apimentada, ouvindo os mariachis, andando de uma arena esportiva para outra e conhecendo pessoas que me acompanham até hoje em grandes eventos esportivos. Foi a minha iniciação no universo olímpico dos megaeventos fora do Brasil.

As transmissões esportivas pela televisão não conseguem passar uma visão real do tamanho dos eventos. Com mais de 6 mil atletas, de 42 países, além de profissionais de diferentes áreas, tive o contato direto e esclarecedor com a indústria esportiva. Vi que o esporte não era mera brincadeira e entendi o porquê de países como Estados Unidos e Canadá levarem tão a sério a prática esportiva. Foi a experiência que me fez entender a importância do esporte na vida das pessoas.

Foi em Guadalajara que ouvi falar pela primeira vez de Yane Marques. O pentatlo moderno foi uma das primeiras provas que cobri. Passei o dia inteiro no Clube Hípica acompanhando as provas de esgrima, natação, hipismo e combinado de corrida e tiro esportivo. Em uma final emocionante, a pernambucana foi superada na corrida pela norte-americana Margaux Isaksen. A brasileira terminou com a medalha de prata. No ano seguinte, Yane se tornou medalhista olímpica, com o bronze conquistado em Londres 2012. Vi também o mesa-tenista Hugo Hoyama colocar no peito a décima medalha em Jogos Pan-Americanos, tornando-se o maior medalhista do país no evento. O recorde durou pouco, pois o nadador Thiago Pereira levou a décima primeira medalha de ouro e assumiu o posto de recordista.

Tive a oportunidade de conhecer uma nova cultura e viver experiências únicas graças ao esporte de alto rendimento. De 2011 para cá, muita coisa mudou. Acompanhei de perto a década do esporte brasileiro. Começou com o Pan do Rio, em 2007. Passou pelos Jogos Mundiais Militares 2011, no Rio, a Copa das Confederações de futebol, em 2013, a Copa do Mundo de futebol, em 2014, e terminou em 2016, com os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio.

Um ciclo se fechou. O esporte nacional terá novos desafios nos próximos anos. A partir de janeiro, a área deve perder prestígio no país. Vai deixar de ter um ministério específico no governo federal e vai se transformar em uma secretaria dentro do novo Ministério da Cidadania. Na prática, a comunidade esportiva vai perder interlocução direta com o presidente da República, lance essencial no jogo da política. No segundo escalão, qualquer assunto relacionado ao esporte deverá ser tratado pelo novo secretário com o ministro da Cidadania que, por sua vez, precisará encaixar os assuntos entre os milhares a serem administrados pela pasta, que junta ainda os atuais ministérios da Cultura e do ministério do Desenvolvimento Social.

Historicamente, o governo é o maior financiador do esporte brasileiro. Existe o esporte profissional, educacional, de lazer, de recreação e de impacto social. O de alto rendimento será o que mais vai sofrer com a mudança. A tendência é de que o investimento diminua, passando a bola para a iniciativa privada, que só tem olhos para um grupo seleto de grandes clubes de futebol e atletas consagrados.

Existe um mito que diz que o esporte é ganhar ou perder, mas só consigo enxergar vitórias. O esporte é uma oportunidade de sonhar, mudar de vida e de evitar problemas de saúde. Pesquisa do governo informa que mais da metade dos brasileiros são sedentários. Basta olhar ao redor e você verá que os dados são reais, com cada vez menos amigos e familiares praticando alguma atividade física.

A viagem até Guadalajara me mostrou que investir no esporte é acreditar em um país melhor. Apostar que uma simples iniciativa tem o potencial de mudar vidas. Mais do que pódios, prestígio ou fama, a maior conquista de um atleta é proporcionar uma melhor condição de vida para os familiares, crescer como cidadão e se tornar exemplo para tantos outros brasileiros.

Breno Barros, 33 anos, gosta de olhar os diferentes esportes olímpicos de forma leve. Participei da cobertura dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio 2016, dos Jogos Olímpicos da Juventude de Argentina 2018 e da China 2014, dos Jogos Olímpicos de Londres 2012, dos Jogos Pan-Americanos de Lima 2019, de Toronto 2015 e de Guadalajara 2011. Estive também nas coberturas dos Jogos Sul-Americanos da Bolívia 2018 e do Chile 2014.

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