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Tênis de Mesa

A verdade sobre os chineses e o pingue-pongue

Passei a semana ruminando. Os meus pensamentos martelaram como uma grama na boca de uma vaca. Só não tirou o meu sono porque ando muito cansado e durmo em qualquer lugar que paro por mais de cinco minutos. Os pensamentos têm dessas coisas mesmo: empacam e parecem que não querem sair do lugar.

Tudo por conta de um extraterrestre chamado Ma Long, 30 anos, que veio do planeta China, de uma galáxia bem, bem, distante. Durante o Campeonato Interplanetário de tênis de mesa 2019, na Arena do Hungexpo, em Budapeste, ele mostrou mais uma vez o domínio da alquimia da raquete e da bolinha, lendo as mentes dos adversários, antecipando jogadas, com movimentos adiantados, em mais uma atuação sobrenatural. Coisas de E.T. Mantendo uma hegemonia que só um atleta considerado o maior de todos os tempos pode sustentar.

No meu tempo de escola, o professor Jaime, carinhosamente chamado de Jaiminho, por conta de seus 1,84m de altura e 200kg de simpatia, me ensinou sobre hegemonia. Foi uma das poucos coisas que aprendi na aula de geografia, confesso. Ele falou que a hegemonia é o domínio ou o poder que algum governo ou alguém exerce em relação aos demais. Jaiminho gostava de contar a história das cidades de Esparta e de Atenas. Porém, a hegemonia corre o risco de virar um monopólio e Ma Long entende bem disso.

O monopólio não é bom para ninguém. Seja no mercado financeiro, em governos ou no esporte. No esporte, é ainda pior. Chegou no momento em que a Federação Internacional de Tênis de Mesa tem que dá um basta no domínio chinês. Não é possível que os chineses sejam mais evoluídos do que os resto no mundo. Fica até parecendo que os chineses jogam tênis de mesa e o resto do mundo joga pingue-pongue.

Ma Long integra a equipe chinesa (desde 2006) vencedora do Mundial por sete vezes. Ele sabe, mais do que ninguém, que a beleza e a excelência estão nos detalhes. Em mundiais individuais, além dos três ouros, foi semifinalista (bronze) em 2013, 2011 e 2009. Ele subiu ao pódio nas últimas seis edições em sequência, um feito inédito desde que a competição passou a ser disputada a cada dois anos.

Além do tri em sequência no principal palco da modalidade, Ma Long tem na carreira a medalha de ouro individual e por equipe nos Jogos Olímpicos do Rio 2016. Quatro anos antes, em Londres 2012, não conseguiu vaga no individual mas foi ouro por equipes. Liderou o ranking mundial de forma ininterrupta entre março de 2015 e fevereiro de 2018. Colecionou títulos de mais de 25 etapas do circuito internacional.

Na final de 2019, Ma Long venceu o sueco Mattias Falck, por 4 sets a 1 (11/5, 11/7, 7/11, 11/9 e 11/5), em 50 minutos de partida. Com a vitória em Budapeste, ele rompeu uma barreira que não tinha paralelo desde os anos 1960: venceu as últimas três edições do Mundial (2019, 2017 e 2015). A última vez que isso tinha ocorrido foi com o chinês Zhuang Zedong, que venceu os mundiais individuais de 1961 (Pequim, na China), 1963 (Praga, na antiga Tchecoslováquia) e 1965, em Liubliana (na Eslovênia).

Se eu fosse jogador de tênis de mesa, faria um abaixo-assinado, colhendo assinaturas dos melhores atletas do mundo, sugerindo a criação de dois tipos de campeonatos. O mundial só do planeta China e o Mundial dos terráqueos mortais. Porque é injusto colocar frente a frente jogadores de universos e de habilidades tão diferentes na mesma competição. Os chineses são o sinal de que há vida fora da terra.

Breno Barros, 33 anos, gosta de olhar os diferentes esportes olímpicos de forma leve. Participei da cobertura dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio 2016, dos Jogos Olímpicos da Juventude de Argentina 2018 e da China 2014, dos Jogos Olímpicos de Londres 2012, dos Jogos Pan-Americanos de Lima 2019, de Toronto 2015 e de Guadalajara 2011. Estive também nas coberturas dos Jogos Sul-Americanos da Bolívia 2018 e do Chile 2014.

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