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Guissone cumpre promessa e dá prata de presente para filho aniversariante

Antes de ir para a competição, brasileiro recebeu pedido do pequeno Jovane Júnior, que completou dez anos no mesmo dia em que o pai brigava em Tóquio pelo pódio que veio na espada. Meta agora é levar outra para as gêmeas

Tóquio – Talvez tenha sido da força da paternidade que Jovane Guissone tenha tirado o algo a mais que todo atleta tem de ter para conquistar uma medalha. Especialmente se ela for paralímpica. Antes de partir para a disputa dos Jogos de Tóquio, nesta quinta (26), o gaúcho de 38 anos recebeu um pedido difícil de recusar. “Pai, traz uma medalha? Lembra que em Londres tu me prometeu e trouxe?”. Quase 16 horas depois, poucos minutos após sair com a prata da competição, abriu o fardamento de esgrima e mostrou a camisa por baixo com a foto do garoto que estava completando dez anos no mesmo dia posado com as duas irmãs gêmeas Alice e Cecília, de apenas três meses.

“É pro Júnior, pra Alice e pra Cecília. Estou feliz, saindo daqui com o dever cumprido. Medalha é consequência. O que vale é o trabalho, o desempenho que eu coloquei na pista e Deus me abençoou”, disse. “Eu saio com prata com gostinho de ouro, com certeza, porque fiz uma boa campanha. Para chegar aqui não foi fácil. Pandemia, lesão, muito trabalho. Esse ano Deus me abençoou com as gêmeas também”, acrescentou Jovane Guissone, que foi ouro na capital inglesa em 2012. “A primeira pessoa que eu vou ligar vai ser a minha esposa. Quero ver minhas filhas, meu filho de aniversário e mostrar a medalha para eles. Estou com muita saudade, estava treinando em São Paulo e moro em Porto Alegre. Estou louco para ir para casa em vê-las”, acrescentou, dizendo que não os vê há três semanas.

Porém, antes ainda tem um compromisso importantíssimo. Disputa o florete, na mesma categoria B que compete na espada, dos Jogos Paralímpicos. A ideia é levar mais uma medalha ‘para não ter briga em casa’. “Florete é a minha segunda arma, 80% do tempo eu treino espada, mas eu to bem no florete, sou o sétimo no ranking mundial. Vou vir voando. Vamos ver, tudo pode acontecer. Vai que o ouro vem no florete. Aí, o que eu vou explicar para meu treinador”, brinca.

E que dia!

“Acordei às 4h da manhã, às 4h30 já estava me arrumando para tomar meu café pra vir para a competição. Dá uma hora de lá até aqui”, conta. No torneio, viu a fase de classificação, as chamadas poules, como “bem forte. Tinha o ucraniano, o Hu Daoliang, que é muito forte também. Todos atletas de ponta, qualquer um podia ganhar. Mas eu estava bem focado e graças a Deus meu dia correu tudo bem e fui conquistando a cada combate. Perdi só um”. O ucraniano é Oleg Naumenko, único a vencer o brasileiro na primeira fase do torneio. Aliás, é uma pedra no sapato, já que o havia vencido nas quartas de final da Rio-2016 e também no Mundial de 2019.

Jovane Guissone esgrima de cadeira de rodas esgrima de CR espada Jogos Paralímpicos Tóquio-2020
Guissone em mais uma final paralímpica (Takuma Matsushita/CPB)

Nas quartas, enfrentou o iraquiano Ali Ammar. “Um atleta forte também, campeão mundial e prata da Rio-2016, e depois peguei o Coutya (britânico Dimitri Coutya), né, que hoje é um cara que está disparado na frente (do ranking mundial). Conquistei a semifinal em cima dele e fui para a final contra o (russo Alexander) Kuzyukov, hoje é um atleta que está jogando muito”, resumiu, sobre a campanha prateada. “Sensação de dever cumprido. Muito trabalho, muito suor para chegar onde eu cheguei. Essa medalha não caiu da noite para o dia, é fruto de muito trabalho. Pra mim é uma medalha de ouro. Tantos atletas estava competindo por uma e só três levam. Estou muito feliz”.

Jovane Guissone esgrima de cadeira de rodas esgrima de CR espada Jogos Paralímpicos Tóquio-2020
Guissone, Kuzyukov e Coutya (Pedro Ramos/rededoesporte.gov.br)

Inspirando para o esporte adaptado

Jovane Guissone cumpriu, com o pódio, outro objetivo que coloca na vida de atleta. “Eu fico muito feliz de estar levando essa segunda medalha, porque olha o salto que a esgrima paralímpica teve no Brasil depois de Londres. Eu lembro que antes, em uma competição nacional, eram 30 atletas. Hoje tem mais de cem. Eu fico feliz que muita gente, através do Jovane, do resultado, vem procurando fazer esgrima, outros esporte adaptados. Tinha muita gente que ficava em casa e não sabia. Isso é legal, trazer pessoas com deficiência para dentro do esporte. É um resultado gigantesco para a modalidade, para o país e para meus amigos e aqueles que estão no Brasil torcendo e acreditando.”

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“Tem muitos casos. Ontem mesmo eu recebi mensagem me perguntando sobre onde fazer esgrima, esporte adaptado. É nesse momento, nos Jogos Paralímpicos, que a mídia vai falando e aí vai crescendo”, finaliza, já se aprontando para trocar de roupa e ir até o pódio pegar o presente que prometeu para o pequeno Júnior. Sexta-feira (27) tem mais. Cecília e Alice estão esperando.

Jornalista com mais de 20 anos de profissão, mais da metade deles na área de esportes. Está no OTD desde 2019 e, por ele, já cobriu 'in loco' os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, além dos Jogos Pan-Americanos de Lima e Santiago

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