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Paralimpíada Todo Dia

Nem ela acreditava na medalha, mas correu e conquistou a prata

“Eu achei que não ia dar, mas eles sempre acharam que ia dar”, Verônica Hipólito sobre as dificuldades do percurso e a união da família para a conquista da prata nos 200m do Parapan de Lima

“Vai, Verônicaaaaa.” Foi o grito que o Estádio do Atletismo dos Jogos Parapan-Americanos de Lima 2019 mais ouviu nessa segunda-feira (26). A mãe Josenilda, o pai Dimas e o irmão Otávio estavam pela primeira vez juntos em uma competição internacional de Verônica Hipólito. Família unida para o Parapan tão simbólico. Verônica tinha tudo para desistir, tinha tudo para não estar aqui: aos 23 anos, já passou por algumas cirurgias, superou 200 tumores, a retirada do intestino, um AVC. Primeira prova? Os 200m – categoria t37. Não era a especialidade. Não teve treino específico – nem nos três meses desde que voltou a competir. Verônica Hipólito se reergueu, se superou e mostrou que tinha sim que estar aqui. Mais que isso, mostrou que tinha lugar no pódio. Conquistou a medalha que nem ela mesma acreditava. Aprendeu, então, a valorizar a conquista da prata. “Eu fico muito feliz com essa medalha. Muito feliz. E, principalmente, por saber que ela é nossa. A gente está sempre junto.” Assista ao vídeo!

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“Eu lembro muito bem, uma vez eu falei para minha mãe que eu queria melhorar, que eu queria voltar. E ela falou assim: ‘você já está melhor, porque você está viva.’ Então aqui eu estou. Eu estou melhor. Sei que tem muitas batalhas pela frente, dentro e fora da pista. Fora da pista tem toda a questão de remédio, tem toda a questão hormonal, tem a questão do peso ainda, mas eu sei que eu posso. Eu sei que a gente pode,” contou Verônica Hipólito em entrevista exclusiva ao Olimpíada Todo Dia.

Foto: Caio Poltronieri / OTD

Não tem jeito. A medalha de prata teve sim gosto de ouro. Principalmente por saber que tinha torcida reforçada. A família e tantos apoiadores. Verônica irradiava: “Eu fiquei feliz que tinha muita gente lá (no momento do pódio). Muitos atletas, muitos atletas de outras modalidades. Meu pai, minha mãe, meu irmão estão aqui. Hoje foram até um pouquinho antes conhecer a Vila. Então eu fiquei muito, muito feliz. E o que tocou muito em mim foi que eu olhei até pra cima lá pro alto e vi os chefes da delegação: ‘a gente conseguiu’. Eu disse também: ‘a gente conseguiu’. Eu estou muito feliz. Não era para eu estar aqui. Eu tinha tudo para não estar aqui. Mas um passo de cada vez e a gente chega.”

A prova

Foto: Washington Alves/EXEMPLUS/CPB

“Raia nove”. “Ela está no canto.” “É a de fora.” “Está mais perto.” “Vai.” “Está valendo.” “Aeee.” “Segundo.” A prova é rápida. Depois, tempo suficiente para abraços e mais abraços de tanta emoção ao ver presencialmente a filha/irmã correndo e garantindo a medalha de prata. Essas foram as reações da família. Maiores incentivadores de Verônica.

Verônica detalha a prova, mas é surpreendida com um vídeo com a nova visão da própria família:  “Ai, são engraçados demais.” “Minha mãe nervosa.” “Olha o meu pai desesperado.” “Meu pai é o mais engraçado de todos.” “A gente não tava conseguindo comprar a passagem.” “Muito contente.” “Primeira de muitas.”

É como um quebra cabeça. Mas não é muito difícil conseguir enxergar a competição pelos olhos da família. Muito menos, por Verônica assistindo ao vídeo da família. “Que imagem linda. Que imagem linda. Eu sou muito suspeita para falar deles. A gente é muito unido, muito, muito, muito – minha família. Claro que tem briga como qualquer outra. A gente não estava conseguindo comprar passagem. Ai minha mãe falou assim: ‘não, não era pra ser, não é pra gente ir, a gente não vai’. Eu: ‘não. Tem que ir, tem que ir, tem que ir”. Ai no final a gente resolveu vir todos juntos. Na ultima tentativa, aos 45 do segundo tempo, deu certo. Veio o André e a Carla também, que são super amigos nossos, que eu fiz amizade com eles nas Paralimpíadas Universitárias e a gente está aí até hoje.”

Foto: Hector Vivas / Lima 2019

A decisão da viagem demorou, a passagem quase não saiu, mas a mãe Josenilda Hipólito sabe que valeu a pena: “Muito feliz, muito feliz porque à princípio não íamos conseguir estar todos aqui. Depois, as coisas foram se encaminhando, dando certo, agora estamos aqui para participar dessa felicidade.”

“A família unida. A alegria e a felicidade é maior, ainda mais com essa vitória dela e o segundo lugar. Estamos muito, muito, contentes. Parabéns, Verônica,” completou o pai Dimas. Logo, o irmão Otávio Hipólito concluiu:”É a primeira vez que eu estou vindo em um lugar fora do Brasil pra assistir minha irmã competir. Estou muito orgulhoso dela. Foi sensacional, ela está voltando agora, dando o melhor de si e ela foi muito bem, com certeza.”

Foto: Washington Alves/EXEMPLUS/CPB

Imagens inesquecíveis, principalmente, por saber o percurso: “Porque quando eu estava lá na cama, deitada, com o fio passando entre as minhas costas pela minha cabeça, quando eu tive que internar de novo, porque eu estava com uma fístula. Quando eu tinha chance de ter que tirar um músculo da minha perna pra fazer enxerto na minha cabeça. Quando eu tinha que ficar em quarentena. só os meus pais poderiam se aproximar de mim e eles tinham que fazer tudo, porque eu não podia levantar nem um prato de comida, eles continuavam comigo,” Verônica Hipólito desabafa.

A união é essa, independente do resultado. “Minha mãe antes da prova falou assim: ‘a gente vai estar orgulhoso do que acontecer’. Achando que eu não ia ganhar medalha, né?” Mas, convenhamos, nem ela mesma acreditava.

O recado final de Verônica e a importância do esporte

“Pai, mãe, Otávio, muito obrigada. Eu achei que não ia dar, mas vocês sempre acharam que ia dar. No final, vocês estavam certo. Corri. Eu dei o meu máximo. Eu sei que essa prata é o nosso ouro. Amanhã tem mais. Depois de amanhã tem mais ainda, eu vou dar tudo de nós pela nossa família. Tudo de nós.”

Foto: Washington Alves/EXEMPLUS/CPB

“Eu só queria dizer uma coisa muito, muito, importante. Eu gosto muito de falar isso. Tem gente que acha que o esporte é um negócio que é o começo e o fim dele mesmo. Não é. O esporte é o começo de muitas coisas. Os meus pais são historiadores, eles sempre acreditam que o esporte era aliado junto com a educação. Eu acredito, meu irmão acredita. Eu comecei por uma brincadeira, hoje eu estou ao redor do mundo, hoje eu estou na faculdade também, voltei pra faculdade. Meu irmão está também. Tudo sempre por causa do esporte. O esporte salva vidas.”

Foto: Flavio Florido/Lima 2019

“O esporte é aliado com a educação. O esporte aliado com a saúde. Então se movam. Se você tem um corpo, você é um atleta, não importa se você é gordo, se você é muito magro, se você é muito alto, se você é muito baixo, se você tem mão, se você não tem mão, se você é pc, se você não é pc, se você é cadeirante, se você é andante. Se você tem um corpo, você é um atleta. Acreditem.”

“E eu tenho que agradecer a muita, muita, muita gente. Inclusive vocês. Eu espero que vocês sintam essa medalha também, de verdade.”

Jornalista formada pela Cásper Líbero. Apaixonada por esportes e boas histórias.

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