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Laguna Olímpico

COI terá que mudar Carta Olímpica para justificar adiamento

Segundo o advogado Alberto Murray, a mudança dos Jogos de Tóquio para 2021 precisará alterar o Artigo 6 do “estatuto” do Movimento Olímpico

Shinzo Abe e Thomas Bach
O primeiro-ministro japonês. Shinzo Abe, e o presidente do COI, Thomas Bach, se encontram na Olimpíada Rio-2016 (IOC/Ian Jones)

Acabou sendo mais rápido do que se imaginava, mas ao menos a especulação terminou. O anúncio desta terça-feira do adiamento da Olimpíada de Tóquio para ano que vem, feito em conjunto após uma conversa entre o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, e o presidente do COI, Thomas Bach. A decisão saiu bem antes do que a própria entidade havia anunciado no domingo, quando colocou um prazo de até quatro semanas para bater o martelo.

Foi, sem dúvida, a coisa mais sensata a ser feita, diante da pandemia do coronavírus que parou o esporte mundial. Mas do ponto de vista legal, o inédito adiamento de uma Olimpíada, coisa que jamais aconteceu na história dos Jogos na Era Moderna, criou um buraco jurídico.

Pela Carta Olímpica, documento que rege as normas do Movimento Olímpico, escrito há 126 anos por Pierre de Freddy, o Barão de Coubertin, responsável pelo renascimento da Olimpíada, isso não seria possível.

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Pelo Artigo 6 da Carta, “uma Olimpíada é um período de quatro anos civis consecutivos, com início no primeiro dia de janeiro do primeiro ano e fim no trigésimo primeiro dia de dezembro do quarto ano”. Portanto, fora desta condição, os Jogos teriam que ser cancelados. Foi o que aconteceu com os Jogos de 1916, em Berlim (ALE), 1940 (primeiro concedido para Tóquio e depois Helsinque, na Finlândia) e 1944, em Londres (GBR), Todos cancelados por causa das Guerras Mundiais.

O blog conversou com o advogado Alberto Murray, ex-presidente do Comissão de Ética do COB (Comitê Olímpico do Brasil) e que será candidato da oposição nas próximas eleições da entidade, originalmente marcadas para o final deste ano.

Neto de Sylvio de Magalhães Padilha, ex-presidente do COB, Murray conviveu muitos anos nos bastidores do COI (Comitê Olímpico Internacional) e ainda tem contatos no órgão que comanda o esporte olímpico mundial. Ele entende que os conceitos originais dos Jogos foram alterados e para justificar o adiamento, a Carta Olímpica terá que ser alterada.

Alternativa jurídica

“A vida inteira eu ouvi de seletos membros do COI que o espaço de quatro anos é sagrado. Que se por qualquer motivo não se possa realizar os Jogos no ano da Olimpíada, eles simplesmente não se realizam. E vamos para a Olimpíada seguinte. Isso sempre foi um motivo de orgulho para o COI, respeitar a tradição Olímpica. Acredito que eles terão que criar uma disposição transitória para estes Jogos, em uma assembleia geral extraordinária. Fato é que essa mudança ataca o cerne das tradições do Movimento Olímpico”, explicou Murray.

Diante de uma situação terrível como a que passa o planeta, com mais de 400 mil casos confirmados de coronavírus, Murray entende que só uma alternativa excepcional poderia justificar o adiamento e inclusive justificar possíveis prejuízos milionários.

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“As seguradoras foram contratadas para pagar essa conta. Será uma briga com elas. Mas elas estão aí para pagar. Claro que o COI mudou muito de 1984 para cá, quando se flexibilizou nos Jogos de Los Angeles e depois se acabou com o amadorismo em quase todos os esportes”, explicou Murray.

Ele utiliza até mesmo um exemplo bem atual que o Brasil está vivendo para explicar os próximos passos do COI. “Tudo tem que ter uma base legal, para não ser clandestino. Se o estatuto de um clube diz uma coisa, tem que segui-lo. Ou mudá-lo. Veja o exemplo do Brasil. Para colocar as pessoas em quarentena, precisou de uma lei federal [calamidade pública] para isso. Não tinha a Lei da Quarentena no Brasil até umas semanas atrás. O governo, sem essa lei, não poderia determinar quarentena só porque agora tem uma pandemia”, afirmou.

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Murray entende que a saída adotada pelo COI e o comitê organizador, ao manter o nome “Tóquio 2020” mesmo para os Jogos sendo realizados no ano que vem, foi a melhor possível. “Fazer os Jogos em 2021 à moda dos asteriscos de pé de página. Manter a denominação de Tóquio 2020. Explicar que os Jogos tiveram um caráter de celebração pelo fim de uma guerra contra inimigo invisível, mas universal”, concluiu.

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