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Ginástica Artística

Os bastidores da medalha de ouro no Mundial de Arthur Nory

O suporte técnico e mental de Arthur Nory para a conquista da medalha de ouro na barra fixa, no Mundial de Ginástica Artística, em Stuttgart, na Alemanha

Esporte individual não existe. Nem a Ginástica Artística nas finais individuais pode ser considerada esporte individual. Acredita? Ginastica é perfeição. É cravar. Fazer tudo certinho. E quando se conquista uma medalha de ouro inédita na barra fixa, em um Campeonato Mundial, que foi realizado em Stuttgart, no último mês? Arthur Nory tem uma lista de agradecimentos. Ele não chegou sozinho ao topo do mundo. Mais do que isso: os bastidores da conquista são inúmeros e estão longe de ser individuais. É coletivo e de toda uma equipe. Assista ao vídeo!

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14.900. Essa foi a nota do ginasta brasileiro ao conquistar a medalha de ouro na Alemanha. Uma série limpa, realizada na base do foco e da persistência. O que quase ninguém sabe é que Arthur Nory mudou de estratégia durante o percurso da final. Além disso, mentalizava esse título desde 2009, quando tinha apenas 16 anos. O Olimpíada Todo Dia conversou com o treinador Cristiano Albino e com a psicóloga Carla Ide e desbravou detalhes e bastidores dessa conquista.

O professor, técnico e segundo pai: Cristiano Albino

Nory comemora com Cris a série no Mundial – Foto: Ricardo Bufolin / CBG

Uma das cenas mais marcantes da final é quando Arthur Nory aguarda a nota depois da série. Após mais três ginastas, a confirmação do primeiro lugar. O brasileiro cai no choro e Cristiano Albino, o treinador, logo chega para a comemoração: “Eu falei p****, eu falei. Eu falei que dava. Campeão Mundial de Barra”. A explosão veio seguida de inúmeras sensações dos bastidores.

“O momento veio porque desde o inicio eu sempre falei que daria (risos). Principalmente, pela nota final. Sempre falei que algo em torno de 14.800 e 15.200 seria medalha. Claro que a cor dela seria impossível saber, pois dependeria dos outros competidores. É um momento de êxtase. Vem um filme na cabeça. Desde o inicio da montagem da série, muitas mudanças, discussões de qual elemento colocar e onde colocar. Foi mto planejado e no início do ano comentei com o coordenador técnico: ‘Nory está com prova de barra forte para disputar medalha’ (risos). Então, a explosão vem por conta disso. Você passa por vários momentos difíceis: dores, lesões, reuniões com grupo multidisciplinar, muda plano de treino, fica sem treinar, acerta, erra, discute, briga e por aí vai. Tudo isso sempre pensando lá na frente, no Mundial. Esse era o foco. Esse era o objetivo do ano. E quando tudo que aconteceu vem na cabeça e você vê o resultado de horas, semanas, meses de planejamento e estudo acontece exatamente como você espera. A emoção é indescritível. Sou muito grato por toda comissão que teve presente a todo momento e envolvidos com esse plano”, destaca o treinador de Arthur Nory.

O comportamento do treinador e a lembrança do dia

“Indescritível (risos). Você reza, pede para Deus. Anda para lá e pra cá. Mãos geladas. Uma mistura de tranquilidade com ansiedade. A cada série que passava e eu via algumas falhas, a apreensão aumentava. Vinham os medos do que ele poderia fazer, de falhar em algum exercício que foi pouco treinado ou que alguma dor limitasse e atrapalhasse, mas logo já tirava esse pensamento negativo e ia logo pensando positivamente. Ele vai acertar. Ele treinou muito. O Nory tem uma cabeça boa e vai acertar. Vai acertar porque trabalhou muito por isso. Seguiu o planejamento e tinha certeza que viria medalha”, relembra em detalhes Cris.

A mudança de série e os planos dos bastidores

“Essa prova que o Nory fez na final foi definida entre abril e maio, então ele vem trabalhando ela há bastante tempo. Executou em 3 competições, inclusive nas finais, tendo um bom aproveitamento de acerto. Paralelamente, também vínhamos treinando uma série com nota de partida mais alta, já pensando no Mundial e, consequentemente, na Olimpíada no próximo ano. A estratégia na final do Mundial dependeria muito da colocação de apresentação do Nory. Antes de entrarmos na competição, já havíamos definido a prova mais difícil, claro, que isso dependeria de um fator: antes dele tinham quatro competidores fortes na disputa. Ao analisar, as provas não foram boas e então resolvemos mudar para prova mais simples, que estava mais treinada, porém tinha que ser impecável. E foi o que aconteceu. A série foi excelente e a nota final era exatamente o que eu vinha pleiteando,” comemora Cristiano Albino.

Quem é Arthur Nory na visão do treinador?

“Treinar o Nory não é difícil, porque ele executa para mim o que qualquer pessoa deveria fazer para ter resultados: os três “Ds”: Determinação, Dedicação e Disciplina. Ele tem essas características e muito mais. O Arthur Nory é comprometido e focado com o trabalho e, o principal, ele ama o que faz. Procura seguir o planejamento a risca, pois sabe o quanto isso é importante. Tudo que faz dentro e fora do ginásio é sempre voltado para seu sonho. Além disso, ele é uma pessoa muito carismática, sempre sorrindo e assim ele treina. Uma pessoa boa e caridosa, sempre que precisam dele, ele está pronto para ajudar. O Nory é uma pessoa muito querida. Eu acredito e sempre pregamos que para você ser um campeão você deve merecer. E por isso não ser bom só no treino. Você tem que ser bom tbm fora do ginásio e isso ele também é. Nosso trabalho aqui no clube (Pinheiros) não visa exclusivamente no resultado queremos e formamos ser humanos melhores”, conclui Cris.

A mente manda no corpo e a responsável é a psicóloga Carla Ide

Arthur ao lado da psicóloga do Pinheiros Carla Ide – Foto: Reprodução / YouTube

Carla Ide já teve seu próprio vídeo no canal de Arthur Nory, que mostra os bastidores da vida de um ginasta. A parceria dessa dupla tem dez anos, tempo mais que suficiente para conhecer o atleta nos bastidores e encontrar ao lado dele estratégias para as competições. O potencial já era visto naquela época e, aos 16 anos, Nory já sabia muito bem o que queria.

“A gente tem uma parceria muito boa desde 2009. Eu sou funcionária do Esporte Clube Pinheiros e trabalho com o Nory desde o ano em que cheguei no clube. Ele, na época, já tinha, já se falava muito do Nory e da possibilidade dele ir aos Jogos Olímpicos. Ele conseguiu pegar ainda as Olimpíadas da Juventude. O trabalho, na verdade, da psicologia é muito de treino mesmo. Treinamento mental. Então o primeiro objetivo é entender como é o funcionamento desse atleta, porque ele precisa se conhecer,” conta Carla.

Desde o início, a dupla buscava conversar bastante para entender como o atleta funcionava. Primeiro, através de aplicações de testes. Carla foi ensinando técnicas para Arthur Nory se blindar, técnicas para controlar a ansiedade e técnicas para concentrar.

“Nory é um atleta que é disciplinado. Em 2009, ele já queria ser um medalhista das Olimpíadas, ele queria muito uma medalha no Mundial. Ele tinha objetivos muito bem definidos. O que a gente precisava era orientar e trabalhar estratégias para que ele alcançasse. Porque saber onde ele queria chegar, ele já sabia,” relembra Carla, que viu os bastidores de Nory para alcançar todos os objetivos.

Bastidores: Arthur Nory e a técnica do Post-It

Foto: Reprodução/Instagram

“Nory adapta as técnicas para o que funciona para ele. Em casa, coloca post-it por todos os lados e vê o que ele precisa fazer. Quadro, post-it. Ele vai dando o formato dele. Ele compartilha a felicidade com as pessoas, compartilha o reconhecimento com as pessoas, compartilha a medalha com as pessoas. A gente conversa bastante. Eu gosto muito de escrever e a gente fala muito disso. Tudo é meio em conjunto. Ele gosta de escrever. Eu falei assim: ‘já pensou em colocar post-it e encher as coisas do que você quer?’ Ele falou assim: ‘ah, eu já fiz isso, já fiz aqui’. ‘Então faz. Faz e me manda.’ Ele vai fazendo e vai me mandando. Coloca isso. ‘Será que é importante colocar nota? Será que não é importante o objetivo?’ E a gente vai trocando. Isso que vamos fazendo. Vamos continuar treinando. Sempre tem uma adversidade nova. Sempre tem um desafio novo.”

O trabalho é coletivo e inteiro de uma comissão multidisciplinar nos bastidores. Para que o atleta entenda do treino como um ensaio para a competição, que envolve ansiedade, preocupações maiores. Treinar no 100% para ficar mais treinado para a competição e estabelecer o mais que 100% na hora da verdade e com a adrenalina para ajudar.

“O Nory responde muito bem a todos os profissionais que trabalham com ele. O que eu vejo hoje é que ele não só entende que tipo de estratégia, que tipo de ferramenta, ele consegue e é mais eficiente para ele, pra controlar a ansiedade, se manter focado, e se manter concentrado, mas ele também usa isso com eficiência. Essa é a principal evolução. Ele se conhece muito bem. Ele foi amadurecendo conforme os anos. Ele faz o profissional querer buscar algo novo pra ensinar. A comissão técnica ajuda, mas ele também faz isso com a comissão técnica. Ele também motiva a gente e deixa a gente focado no mesmo objetivo. Então é uma troca.”

Assistí-lo e vê-lo competir é sempre emocionante para Carla Ide. Ela diz que sente a emoção mesmo de longe, através da energia que Nory passa. Ele, em seus depoimentos, sempre reforça a medalha para a equipe que está nessa caminhada ao seu lado nos bastidores.

“A gente agradece muito e aceita essa medalha. É muita parceria. Todo mundo trabalha muito pra ele estar lá nas melhores condições, pra só fazer o que ele sabe fazer. Só a série dele. Então quando isso acontece, a gente fica muito agradecido. A gente fica muito feliz pelo reconhecimento das pessoas que estão trabalhando com ele. Ele agradece, mas a gente também agradece. Porque é uma oportunidade de trabalhar com ele. Isso é sempre muito importante.”

Como definir Arthur Nory?

“Que coisa difícil, né? O Nory se mostrou gigante. Eu sempre falo do Nory como um atleta muito disciplinado. Um atleta que da gosto de trabalhar. Eu fico feliz em trabalhar com ele. Eu sinto muita alegria por ter ele por perto. É muita felicidade poder participar disso e poder ter essa evolução com ele, esses ganhos todos com ele. Ele é sensacional.”

Jornalista formada pela Cásper Líbero. Apaixonada por esportes e boas histórias.

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